quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

As perdas, memórias

Eu apago a luz, encosto a porta e corro pra debaixo das cobertas. mesmo quando não está frio. pelo menos um lençol...eu tenho uma coisa com o escuro.
não é medo. mas eu tenho ideias de coisas paranormais e fico com mais medo das minhas ideias do que do escuro.
As vezes deixo a luz do corredor acesa pra quando minha mãe subir pro quarto. Mas ela já estava no quarto.
Foi tão dificil fechar o olho. Normalmente fecharia o olho rápido por conta do tal medo. Mas ficou aberto e não vinha nada pra fechar o olho e nem pra me trazer o sono. Não foi difícil o pensamento chegar até ela. Depois até eles.

Primeiro pensei no espectro do conto de Hamlet. Aparecesse para me orientar alguma coisa, com alguma fumaça, como no filme. Mas isso me dava medo demais e então eu imaginei o rosto dela sorrindo. De repente não foi muito difícil escutar a voz dela e a sua risada. eu temi por um dia esquecer dessa voz. Lembrei das mãos dela, lembrei dela comendo doces (era o que mais gostava nessa vida!), lembrei do óculos e as blusas que sempre pareciam ser de algum tecido como lã, malha ou tricô.
Lembrei não. Passava na minha cabeça como lembranças, como um filme. Flashs.
porque eu senti a mão dela nos meus cachos de quando eu tinha dois anos. eu não lembro disso mas eu senti. As mãos dela eram sempre evidentes no pensamento.
As vezes penso no lugar onde ela está fisicamente. É um lugar alto, onde eu senti o céu muito próximo. Não foi enterrada, foi colocada dentro de uma espécie de cubículo só que mais comprido, retangular. Nesse dia choveu. Pingos fortes me acertaram e eu disse que eram lágrimas de Deus.

Eu já estava chorando, chorando muito.
a ideia de que a vida vai levar todas as pessoas embora é complicada.

Logo pensei nele. Escutei a voz dele.
lembrei quando passávamos no seu trabalho, lá num posto de abastacimento de viaturas da polícia. Um DP perto do center norte. Fazia plantão.
Ele sempre me oferecia guaraná.
oferecia confete, às vezes. eu aceitava.
Pude ver a sua estatura. Era menor do que eu. eu via seu sorriso. ele não sorria sempre, era alguma coisa nos dentes que o fazia mais ou menos "ranger" dando a impressão que estava sorrindo. Mas era bonito ver o sorriso (ou imaginar que era um!).
me senti ruim por demorar um pouco mais de um ano pra esse sentimento vir à tona. antes eu chorei pelo sofrimento do meu pai e por vê-lo partir...agora a dor da sua ausência realmente me tomava.

Chorava muito, por dentro, por fora, com os olhos (que se mantinham abertos), com a alma, o corpo todo, físico e metafísico.
não dava pra parar.
e o natal? e o tutu-de-feijão do natal? eu nunca comia no almoço, só requentado nos outros dias, porque desde 2000 eu almoço o dia 25 com meu pai.
eu via meu vô chorando no dia que ela foi. eu imaginava a área da casa do interior, Três Barras, seria triste e desolada, quando o sol batia forte e fazia silêncio. Da pra pedir pra fazer doce-de-leite pra gente comer com queijo? Não.

Eu devia ter ido mesmo no hospital ver os últimos dias dele? Eu não fui, até hoje não sei se devo me culpar por isso...
a vontade de abraça-los é tão absurda.
Dói.
E meus olhos ainda não conseguem se fechar e nem parar de chorar, a pupila se acostuma com o escuro e não é tão dificil de enxergar.

Por fim, eu falei pra Deus.
"se pudessemos pedir para adiar a ida de todo mundo, pediríamos e adiaríamos pra sempre."
e dormi.

(não usei a palavra nenhuma vez no meio
mas

acho que da pra ficar bem claro que no meio disso, ou melhor, em tudo isso existe AMOR).

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