sábado, 20 de fevereiro de 2010

Língua pode ser definida um código formado por palavras e leis combinatórias por meio do qual as pessoas se comunicam e interagem.

Dominar o código é importante, mas não devemos nos esquecer que o sentido do que se diz ou escreve será definido pelo outro, nosso interlocutor/leitor, que não é uma figura passiva, que está ali apenas esperando o que temos a dizer.

Ele tem seus próprios valores, pensamentos, etc. e, portanto, compreenderá o que dissermos de acordo com seus critérios.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Fechando fachada

Olhou para os anéis prateados na barraquinha do metrô e os achou feios. Pareciam ser de latão, deviam pintar o dedo de verde com o tempo e, sei lá, o que iam pensar dela? Melhor procurar em outro lugar. Foi a loja de bijouterias do shopping e lá encontrou várias opções de anéis prateados. Escolheu um bem simples, que tivesse pedrinha, porque essa era a identificação da mulher (como se já não fosse óbvio, tratando-se da heterossexualidade). Não era uma joia mas dava pra enganar, pelo menos por um tempo. Colocou sua calça vermelha, a camiseta branca e o anel prateado no dedo específico da mão direita. Foi para a faculdade.
Sua fachada estava pronta. Ela é comprometida, veja no dedo. Vai entrar na faculdade com mais respeito. Aliás, que outro jeito ela poderia fazer pra disfarçar seu jeito desengonçado? Derrubava coisas no chão, trombava facilmente, gaguejava e...bom, pelo menos ela tinha um "namorado" e ninguém poderia julga-la de nada. Não diria nada, iria esperar alguém perguntar e inventaria uma história de amor, uma data e...melhor não, ninguém quer saber tantos detalhes. Diria apenas "sim, eu namoro". Dependendo do nível de amizade, inventaria uma história, contaria intimidade mas...ué, se criasse uma intimidade, não poderia manter essa mentirinha e ah! quem garante que teria uma amizade? Mas...são quatro anos de curso, impossível. Já estava sentada na sala, com o anel no dedo, não tinha como fugir. Ela daria um jeito.
No primeiro dia, foi só festa. Levaram os alunos para os bares e, de repente, ela se deparou com muita gente bebendo, se divertindo, tropeçando, até dançando! Ela ria, desnorteada e desengonçada, o quê foi mesmo que deram pra ela beber..."minha mãe vai me matar...". Era um barulho, era incessante, ela tentava se concentrar e olhava para seu dedo onde a "aliança" reluzia. Ria muito, ria muito olhando para o brilho do anel, quando um cara, bêbado cambaleando, trombou com ela e disse "gostei da sua calça!". Ela olhou para sua calça, sua calça vermelha...levantou a cabeça sorrindo e enxergou o rapaz, que usava calça vermelha e camiseta regata preta. Achou engraçado, riu mas ainda estava concentrada na necessidade daquele anel prateado. Olhou de novo para o cara que sumia na multidão e viu a tatuagem no seu braço "like a rolling stones".
Ficaria com o anel até alguém perguntar. Todo mundo usa uma fachada, todo mundo finge alguma coisa, todo mundo cheira pó e diz gostar de açúcar. Ela andaria desengonçada com um anel brilhante no dedo, diria que era desengoçada porque vivia bêbada. Teria uma nova versão, a partir dali.
Andou na rua cantarolando "she's only 18, don't like the rolling stones..."


(isso é FICÇÃO)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O Fórum

Lá é triste. Cinza, bege, tons do que um dia foi branco e acabou ficando amarelado com o tempo. Amarelado nos rostos, nas paredes, um pouco no chão.
As pessoas são tristes e parecem que vagam sobre os corredores em câmera lenta. Existem ruídos de falatórios, um mínimo de risada. Sorrisos são quase inexistentes.
Sorrisos partem dos rostos de alguns advogados aprovados pela OAB. "Essa causa já está ganha". Esses cinco mil, que seu cliente sofrido que tenta vencer um processo com suas economias, também. A sala de audiência contém uma mesa extensa, advogados, a família e um juiz que se dirige estupidamente a uma criança de 10 anos. As famílias decidem ali a pensão, os pais se esquivam, as mães apertam as mãos dos advogados para conseguirem um dinheiro para o leite da criança...
As crianças ainda não entendem nada. Só acham o lugar horrível.
Tantos papeis, arquivos, pastas, prateleiras. E se você olhar feio para um dos funcionários, são capazes de colocar sua ficha no último lugar de uma pilha de processos.
Pobres funcionários públicos. Enchem dinheiro dos cofres públicos pagando concursos, conquistam um trabalho com salário garantido pra sempre e descobrem, depois de anos, que estão numa prisão, num sistema, na mediocridade. Assim, não se reprimem em tratar mal alguém, apesar do "alguém" pagar, indiretamente, o salário dele.
O funcionário do banco usa aliança dourada no dedo esquerdo, camisa por dentro da calça e cinto marrom. Fala de cabeça baixa e tem habilidade no teclado. Suporta aquilo porque deseja fazer a mulher e as crianças felizes. Ele precisa daquilo, não tem jeito. Mais de 40 anos é difícil alguma coisa nesse país...onde guardei aquele papel mesmo?
Funcionários, pessoas, alguns advogados andam de cabeça baixa pela causa perdida, o desespero de tentar uma salvação judiciária.
O operador da fotocópia é jovem e parece não saber o que acontece ali. Seu rosto é neutro. Por um pouco de terno e gravata, o mesmo se confundiria com os advogados sorridentes.
Vendo de longe, o prédio se confunde com uma penitenciária. De novo, o cinza. Grades. Gente triste...

Dá pra trombar com algumas crianças rindo do lado de fora.
rindo porque estão do lado de fora
rindo porque são crianças.

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Poder Judiciário
Fórum Regional de Itaquera.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Chuva

Não sei falar sem muito escrever
ficam linhas, palavras pequenas, soluços na garganta, lágrimas nos olhos.

nasceu há um pouco mais de um ano
o que eu nunca vi antes
...
a chuva desceu e molhou o chão
ficou ali, ficou caindo, caiu mais e o carros não pararam
nem a conversa.
foi preciso admitir a beleza pra se ouvir o suspiro
virei vagarosa, com charme e ânsia de tocar o que falava como um canto, como a seda.
arfava quente, cheirava meu rosto, procurava a boca.



hoje na chuva corremos e fomos pequenos rindo, com frio
cabelos molhados.
pingos brilhantes dançavam no seu rosto
dançavam até o queixo para pingar!
seu olho tem uma cor que eu nunca vi e brilhavam nos pingos, refletindo a água no seu rosto em seus olhos.
assim como as lágrimas de quem ama tanto.

depois da chuva com o calor terno de quem compartilhou a mesma água,
eu me encolhi pequena
A Sua
criança que se encolhe no peito procurando o quente para proteger.
Me toca
com amor, meu amor.
meu olho fecha para você adivinhar sensações,
minha boca abre pra você me dar a alma.

desperta paixão,
se apaixona,
encanta
meu olho é seu olho, mesma visão

seus cílios tão grandes
fazem cócegas
igual faz na barriga as borboletas que você brota
a borboleta apaixonada que pousou.


perdão
palavras vão saindo
meu olho vai enchendo
amor explodindo!

toca em você dormindo agora no colchão, agarrado ao travesseiro
sonhando
com

a chuva.