quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Fechando fachada

Olhou para os anéis prateados na barraquinha do metrô e os achou feios. Pareciam ser de latão, deviam pintar o dedo de verde com o tempo e, sei lá, o que iam pensar dela? Melhor procurar em outro lugar. Foi a loja de bijouterias do shopping e lá encontrou várias opções de anéis prateados. Escolheu um bem simples, que tivesse pedrinha, porque essa era a identificação da mulher (como se já não fosse óbvio, tratando-se da heterossexualidade). Não era uma joia mas dava pra enganar, pelo menos por um tempo. Colocou sua calça vermelha, a camiseta branca e o anel prateado no dedo específico da mão direita. Foi para a faculdade.
Sua fachada estava pronta. Ela é comprometida, veja no dedo. Vai entrar na faculdade com mais respeito. Aliás, que outro jeito ela poderia fazer pra disfarçar seu jeito desengonçado? Derrubava coisas no chão, trombava facilmente, gaguejava e...bom, pelo menos ela tinha um "namorado" e ninguém poderia julga-la de nada. Não diria nada, iria esperar alguém perguntar e inventaria uma história de amor, uma data e...melhor não, ninguém quer saber tantos detalhes. Diria apenas "sim, eu namoro". Dependendo do nível de amizade, inventaria uma história, contaria intimidade mas...ué, se criasse uma intimidade, não poderia manter essa mentirinha e ah! quem garante que teria uma amizade? Mas...são quatro anos de curso, impossível. Já estava sentada na sala, com o anel no dedo, não tinha como fugir. Ela daria um jeito.
No primeiro dia, foi só festa. Levaram os alunos para os bares e, de repente, ela se deparou com muita gente bebendo, se divertindo, tropeçando, até dançando! Ela ria, desnorteada e desengonçada, o quê foi mesmo que deram pra ela beber..."minha mãe vai me matar...". Era um barulho, era incessante, ela tentava se concentrar e olhava para seu dedo onde a "aliança" reluzia. Ria muito, ria muito olhando para o brilho do anel, quando um cara, bêbado cambaleando, trombou com ela e disse "gostei da sua calça!". Ela olhou para sua calça, sua calça vermelha...levantou a cabeça sorrindo e enxergou o rapaz, que usava calça vermelha e camiseta regata preta. Achou engraçado, riu mas ainda estava concentrada na necessidade daquele anel prateado. Olhou de novo para o cara que sumia na multidão e viu a tatuagem no seu braço "like a rolling stones".
Ficaria com o anel até alguém perguntar. Todo mundo usa uma fachada, todo mundo finge alguma coisa, todo mundo cheira pó e diz gostar de açúcar. Ela andaria desengonçada com um anel brilhante no dedo, diria que era desengoçada porque vivia bêbada. Teria uma nova versão, a partir dali.
Andou na rua cantarolando "she's only 18, don't like the rolling stones..."


(isso é FICÇÃO)

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